Eu vou enterrar meu coração
Com uma grande mão de pontudas garras
Sob o sol escaldante do sertão
Vou escavar o chão
E ali vou enterrar meu coração
Vou apertar devagarzinho mais uma vez meu amiguinho
Contra o peito numa leve despedida
Vou embalsamá-lo, limpar sua ferida
- posto que morreu de dor-
E sob o chão seco do sertão, vou enterrar meu coração
E ele fecundará a terra
E da união do seco com o triste
Brotará um rio
Vida e riso assim trará
De volta ao sertão sombrio e triste
As crianças ao verem isso sorrirão
Na correnteza abundante de minhas lágrimas
E a esperança vai nascer
No verde novo da mata
Meu coração e minha tristeza que eram pobres
da morte salvarão
Outros corações secos e tristes
E assim em meu martírio serei feliz
Mas não haveria onde depositar tal felicidade
Pois meu coração enterrado já estaria
Então novamente eu doaria minha alegria
Ao vento desta sorte...
E rogaria a Deus que a transformasse em chuva de paz
E em minha tormenta que me inundasse essa chuva
Que fecundasse meu peito de novo
E que dele por um milagre um coração me brotasse
Cheio de verde, de céu
Cheio de luar de sertão e de riso infantil
Que batesse em ritmo de música
E que tudo ao redor de mim fosse música, tambor e dança
E que a humanidade inteirinha unida
Celebrasse comigo a gargalhar
O renascimento do amor