quarta-feira, dezembro 26, 2007

canção maldita


é maldita!
a terra grita,
é maldita!
o céu repete...
uma estrela chora
enquanto outra se derrete.
olhar fundo,
mar de sombra,
olho a boiar na solidão amarga, no balanceio da lágrima
que invade a tarde
engolindo a cidade...
pela rua, à luz da lua
esvaindo-se em passos largos,
estremecendo inteiro esse chão que os devora
estremecido ouvido, não arranha os céus que o rejeita
(nem onde sobe o pensamento)
é só ouvido que ouve e cala...
quando não há voz, a lágrima é que fala
hoje os pensamentos só descem
descem até a loucura abismal do magma que tranca as portas
que afasta o zelo,
que destrói,
que constrói,
só os monstros entendem o fogo, amam o fogo, cavalgam o fogo...
os monstros sentem na carne a arma dilacerante das pessoas que têm pele
e tecem silenciosos na alcova e na encolha
e por onde olhos bondosos não possam ver,
a canção dos malditos
que abençoa com fertilidade
a cama, a mesa e os filhos da sensualidade.

segunda-feira, dezembro 10, 2007


no fantasma das coisas que me deste
eis a minha resignação
ei-la no contraste da tua ira com minha calma
e naqueles breves instantes que não sabes o que dizes
e por puro despeito não te calas,
onde os insultos dão vazão à palavra irrefletida, contrariando real intento por malícia...
me resigno na arte reticente do olhar
em assombro e meditação silenciosa, como faz a natureza após terrível vendaval
onde cessa o furor dos incompreendidos renasce a flor da esperança
em solo ainda quente e mais que fértil
como um peito rasgado e sangue a mostra,
um rio que corre em vasto leito, fertilizando puras expectativas de um porvir singelo
velando sentimentos que se esvaem no rufar de um coração maltratado, que merece paz e sabe disso...
resignar-se é saber que a vitória consiste em ganhar terreno em si mesmo
em possuir a si mesmo e achar-se pleno, é entender a indivisível centelha de vida que há entre um esquecimento e um amanhecer, admirando o belo nas entranhas de uma ruptura...
é compreender que a dor é quem pare a vida
e o choro é quem anuncia que o futuro ainda não morreu.

23/08/2007




quarta-feira, dezembro 05, 2007

Luz também cega.


Eu não deveria ter olhado aquela luz
aquela...luz...
ofuscou meus olhos
olhos,
olhos,
olhos...
eu vi o olhar da luz no luar
eu acenei para a luz e olhei a luz bem no fundo dos olhos,
olhos, olhos...
e aquela luz acendeu os meus olhos no fundo, profundo
aquela luz me fez entender a cegueira do universo que era eu, que estava bem no centro da cegueira universal, eu era os olhos da cegueira mental de todas as coisas do mundo!
era eu por causa da luz... EU!
era eu sim e a luz me fez saber disso
pois eu não devia ter olhado pra ela
aquela luz ofuscou meu instinto de sobrevivência, estuprou algum pudor maldito plantado de erva daninha, a luz invadiu o meu centrismo vinculado absoluto, a luz estilhaçou minha dor de não ser mais nada além de egoísmo...a luz jogou fora todas as minhas palavras...
e pela luz eu dei uma volta em mim mesma, como planeta sem astronauta,
eu me abracei e descobri que eu estava despida...
eu estava nua dentro de mim!
quando a luz entrou não havia mais nada além de nudez, a minha nudez característica de pedinte.
no instante da mesma vivência...ência...ência...caracol, torre, meta-eu
nua,nua, nua-nua-nua-nua-nua...em repetência...
...
eu estive no fim antes de ir ao começo da eternidade, eu levantei as saias da eternidade
eu toquei a eternidade e ela era tão vulgar quanto eu era vulgar,
tudo sim por causa da luz, que corta, que sangra,que dói
e eu não quero mais sangue
não bebo mais sangue
eu tenho nojo de sangue ( por que sangue no escuro é doce?)
e me enojo também de todo ato em si mesmo que seja somente por si mesmo vivente
à humanidade não cabe a luz e sim a cegueira
que farei eu agora sendo humana que vê?
ou que sabe que não vê...
que não pode,
que não quer ver nada!
que está sendo continuamente agora, nesse agora de olhos e luz, o princípio reverberado da solidão, no grande vácuo do silêncio e mais nada!
e foi a luz quem fez a razão de tudo isso com apenas um toque e um olhar.
A luz me disse: Haja luz!
me acendeu,
e foi embora.